Desde o início da divulgação, o filme do Coringa é alvo de polêmicas sobre instigar comportamento violento e justificar os atos do vilão pela loucura. O diretor Todd Phillips e o ator Joaquin Phoenix, que dá vida ao protagonista, têm sido questionados sobre isso e vêm tratando a questão de forma parecida.
O discurso é o de que uma obra de arte não pode ser culpada por atos violentos e que gatilhos para esse tipo de comportamento podem ser encontrados em qualquer lugar. Phoenix chegou a se irritar durante uma entrevista, abandonando a conversa momentaneamente. Já Phillips culpou movimentos de “extrema-esquerda” pelas polêmicas.
[irp posts=”81984″ name=”Coringa: diretor culpa extrema-esquerda por polêmicas do filme”]
No entanto, o histórico não colabora. Em 2012, na cidade de Aurora, estado americano do Colorado, durante uma sessão de cinema exibindo o filme Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge, um homem de 24 anos efetuou disparos contra a plateia, matando 12 pessoas e ferindo outras 70.
O atirador foi preso minutos depois, em estado alterado, dizendo que era o Coringa. Ele também tinha o cabelo pintado de verde, assim como a versão do personagem interpretada por Heath Ledger em Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008).
[irp posts=”81733″ name=”Coringa: cinema alvo de tiroteio em 2012 não deve exibir o filme”]
O cenário em 2019 é ainda mais tenso do que em 2012. Casos de atiradores em locais públicos passaram a ter alguma frequência nos Estados Unidos e também ocorreram no Brasil. Todos têm em comum o fato de que os autores dos massacres enxergavam seus atos como gloriosos, verdadeiros manifestos de ódio.
Jovens geralmente introvertidos, denominados “incel” (abreviação em inglês para “celibatários involuntários”) por terem problemas de relacionamentos, muitas vezes vítimas de bullying, acreditam na redenção através do assassinato de pessoas que consideram inferiores – mulheres, negros, gays e pessoas socialmente desinibidas em geral.
[irp posts=”80757″ name=”Coringa: filme é acusado de promover comportamento incel; entenda”]
As famílias de algumas das vítimas do massacre de Aurora em 2012 chegaram a enviar uma carta para a Warner, repudiando o lançamento do filme. Para essas pessoas, a figura do Coringa ficou fortemente associada ao massacre e o filme de 2019 poderia potencializar o efeito que já foi sentido por elas da pior forma possível, já que a história da origem do personagem poderia ser identificada como a de qualquer “incel”. O Coringa, na visão delas, poderia se tornar um símbolo dessa cultura.
A resposta da Warner veio na mesma linha adotada por Phillips e Phoenix, negando qualquer incentivo à violência e prestando solidariedade às vítimas. Será que o filme, realmente, glorifica o vilão e faz apologia a comportamentos violentos?
[irp posts=”81770″ name=”Warner quebra o silêncio e nega que Coringa apoie violência”]
No fim das contas, Arthur Fleck pode ser a representação de uma sociedade doente e que perde o controle com certa facilidade. Por outro lado, ele também pode ser visto como um aviso de que isso pode acontecer caso as coisas não mudem.
Atenção: spoilers de Coringa a seguir!
No filme, vemos que Arthur Fleck é um sujeito problemático, mas o meio em que está inserido é tão problemático quanto (ou mais do que) ele. Conforme a trama avança, o personagem se revela tão vítima quanto culpado dos acontecimentos que vemos.
O abuso na infância por parte da mãe, paciente psiquiátrica, e o corte na verba do serviço de saúde, que o faz ficar sem o acompanhamento médico e os remédios, sem dúvida mostram o “lado vítima” – as circunstâncias que deram origem ao Coringa.
[irp posts=”81994″ name=”O Batman aparece em Coringa? Como é a aparição de Thomas Wayne?”]
Por outro lado, Fleck faz escolhas erradas que só o atormentam cada vez mais. Um assassinato não pode ser visto como solução para qualquer problema. Momentos como quando ele se sente livre após matar os homens no metrô mostram que o Coringa não é apenas um paciente psiquiátrico: ele tem a maldade dentro de si, ainda que adormecida até aquele ponto.
O apresentador de TV Murray Franklin (Robert De Niro) acaba se tornando o alvo, a personificação de todas as frustrações de Arthur Fleck, principalmente depois que Thomas Wayne (Brett Cullen) lhe deu um choque de realidade da pior forma possível. O Coringa faz um discurso vitimista no programa de Murray Franklin, sendo rebatido pelo apresentador. É claro que as pessoas esquecidas dos subúrbios de Gotham estão à mercê dos poderosos e vivem vidas sub-humanas, mas a realidade enxergada por Fleck é totalmente distorcida por sua loucura e os atos extremos fazem com que qualquer possível argumentação coerente do Coringa seja descartada.
Uma obra de arte não pode ser responsabilizada por qualquer ato violento que venha a acontecer no mundo real, como Phoenix afirmou durante a divulgação. O filme do Coringa pode até ser enxergado como um gatilho se assim alguém o quiser, mas quem encontrar esse gatilho no longa de Todd Phillips, provavelmente já representa um perigo para si mesmo e para a sociedade antes mesmo do filme ser feito ou do Coringa ser criado – da mesma forma que Arthur Fleck.
O outro lado da moeda também está lá para quem quiser ver. Um fato é onipresente em qualquer representação do personagem: o Coringa é um homem louco, com uma visão de mundo distorcida. Sua origem pode ter base nos distúrbios psíquicos – como é apresentado aqui -, em produtos químicos ou em qualquer outra razão de ser, mas nada disso justifica as ações cometidas pelo vilão. Nem por qualquer outra pessoa.
[irp posts=”81986″ name=”Crítica: Coringa mostra que é possível amar Arthur Fleck e odiar o vilão”]
Sobre Coringa
A Warner anunciou, ainda em 2018, a produção de um filme contando a origem do Coringa. O longa não faz parte do Universo Estendido da DC, onde o vilão já foi interpretado por Jared Leto em Esquadrão Suicida. Joaquin Phoenix foi escalado para o papel principal.
A promessa é de um clima completamente diferente de um filme de herói – até por Coringa ser um vilão. A produção contará a origem do Coringa de uma perspectiva mais “policial” e mais “dark”, com um pouco mais de realismo do que se poderia esperar.
Confira o trailer:
Além de Phoenix no papel principal, outros nomes confirmados são Robert De Niro, Zazie Beetz (como Sophie Dumond), Brett Cullen (como Thomas Wayne), Glenn Fleshler e Bill Camp. A direção é de Todd Phillips (Se Beber Não Case).
O filme do Coringa deve ter classificação para maiores de 18 anos, devido a cenas de violência explícita e, possivelmente, nudez.
Coringa chega aos cinemas em 3 de outubro de 2019. Veja, a seguir, uma sinopse preliminar do longa:
“Vinte anos antes do Batman salvar a cidade na trilogia de Cavaleiro das Trevas, Gotham era um lugar perigoso. Nos cantos onde o crime se escondia, um homem tenta escapar do seu terreno desafortunado, através de uma paixão pela teatralidade e pela comédia stand-up. No entanto, um dia ruim é tudo o que basta nesta cidade e, logo, este homem de boas intenções se tornou o criminoso mais perigoso de todos: o Coringa.”
Seja o primeiro a comentar