A Netflix tem implementado uma abordagem inusitada em suas produções: garantir que o público consiga acompanhar os enredos mesmo enquanto realiza outras atividades, como dobrar roupas ou mexer no celular.
Segundo uma investigação publicada pela revista n+1, roteiristas que já trabalharam com a plataforma relataram que essa orientação vem diretamente dos executivos do serviço de streaming.
De acordo com as fontes, os personagens são instruídos a verbalizar suas ações e intenções, permitindo que espectadores distraídos consigam entender o enredo, mesmo que não estejam totalmente focados na tela.
Esse estilo de diálogo, conhecido por ser mais direto, é evidente em filmes como Um Desejo Irlandês, estrelado por Lindsay Lohan.
No longa, uma fala da atriz exemplifica a estratégia:
“Passamos um dia juntos. Admito que foi um belo dia, cheio de paisagens dramáticas e chuva romântica, mas isso não lhe dá o direito de questionar minhas escolhas de vida. Amanhã vou me casar com Paul Kennedy.”
A resposta do personagem ao lado também reforça essa abordagem:
“Tudo bem. Essa será a última vez que você me verá, porque depois que esse trabalho acabar, vou para a Bolívia fotografar um lagarto raro.”
Esse tipo de diálogo, descrito como “exposição explícita”, é projetado para servir como “pontos de áudio” para aqueles que estão assistindo de forma casual.
O objetivo é alinhar o conteúdo ao que especialistas chamam de “visualização casual”, um hábito geralmente associado a gêneros mais leves, como sitcoms, programas de realidade e documentários de natureza.
Essa tendência, já apontada por veículos como o The Hollywood Reporter, também foi identificada em produções recentes da plataforma, como o filme de ficção científica Atlas, estrelado por Jennifer Lopez.
A crítica definiu o longa como “mais um filme da Netflix feito para ser assistido pela metade enquanto se dobra roupa.”
Além disso, a estratégia da Netflix vai além dos diálogos. Segundo relatos, projetos têm sido aprovados sem que os roteiros sejam lidos pelos executivos responsáveis, refletindo uma ênfase na quantidade de produções, em detrimento da narrativa detalhada.
Essa abordagem, apelidada de cinema Tide Pod, busca entregar conteúdos chamativos e acessíveis, mas que se dissolvem rapidamente no cotidiano do público.
Enquanto isso, críticos do setor questionam se essa nova fase representa uma evolução na forma de contar histórias ou um possível enfraquecimento da qualidade artística nas produções.
Com o streaming dominando o mercado de entretenimento doméstico, a Netflix parece estar moldando um novo modelo de consumo, que prioriza a presença constante de conteúdo em vez de experiências cinematográficas memoráveis.
FONTE: n+1
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