O veterano cineasta Terry Gilliam será homenageado no Festival de Cinema de Úmbria, na Itália, com uma exibição especial de Brazil: O Filme, que completa 40 anos em 2025. Ícone cult da ficção científica distópica, a produção de 1985 foi indicada a dois Oscars, venceu dois prêmios BAFTA e se tornou referência por sua crítica ácida à burocracia e ao autoritarismo.
O longa, estrelado por Jonathan Pryce como o sonhador Sam Lowry, mistura humor sombrio, fantasia e crítica política, em um cenário opressor dominado por uma vigilância governamental quase divina.
Em entrevista ao Deadline, Gilliam afirmou:
As pessoas ainda me perguntam como consegui prever o mundo de hoje. Eu apenas prestei atenção

Terry Gilliam em 2019 (Reprodução/Wikipedia)
‘Brazil’ e o eterno embate com Hollywood
Terry Gilliam relembra com ironia a disputa histórica com a Universal pela versão final do filme nos EUA. “Foi quase divertido brigar com o estúdio. Eu não ia deixar mudarem o filme. Ou você tem carreira ou faz o filme que quer”, diz o diretor, que ficou conhecido também por seus trabalhos no grupo Monty Python, incluindo a comédia A Vida de Brian.
Ele ainda comenta sobre a durabilidade do longa-metragem: “Brazil: O Filme não envelheceu, o que prova que as questões que aborda continuam atuais. Na época, quando Dick Cheney e George W. Bush governavam, parecia até que eles estavam fazendo uma releitura não autorizada do filme”.
Para Gilliam, o filme continua relevante porque o mundo sempre precisa de um “inimigo”, real ou fabricado, e os mecanismos de controle e vigilância que ele imaginou há quatro décadas permanecem vivos.
Streaming ou cinema? Gilliam ainda aposta na tela grande
Apesar de considerar plataformas como a Netflix para voltar a trabalhar, Terry Gilliam reforça sua paixão pelas salas de cinema:
Ver um filme na tela grande é quase uma experiência religiosa. Quando vejo alguém assistindo Star Wars no celular, tenho vontade de tirá-lo da tomada.
Novo projeto com elenco estelar enfrenta barreiras financeiras
Sem dirigir desde O Homem Que Matou Dom Quixote (2018), Gilliam tenta viabilizar sua nova comédia apocalíptica Carnival at the End of Days, estrelada por Johnny Depp, Adam Driver, Jeff Bridges, Jason Momoa, Tom Waits, Asa Butterfield e Emma Laird. Ainda assim, o financiamento segue incerto.
Sobre isso, o cineasta desabafou:
Tenho esse elenco incrível disposto a receber menos, mas ninguém quer bancar. O problema não são os atores, são os produtores e estúdios que estão cada vez mais tímidos.
Satirizando Deus, o apocalipse e a humanidade
A nova obra escrita com o jovem dramaturgo Christopher Brett Bailey traz Deus planejando destruir a humanidade por arruinar seu “belo jardim”. O tom é de comédia, mas o diretor admite que o roteiro pode ter que ser reescrito. “Trump virou o verdadeiro carnaval. Ele superou nossa sátira”, brinca.
Reflexões e distanciamento da própria obra
Aos 83 anos, Gilliam diz não rever seus filmes e se sentir como uma pessoa diferente daquela que os criou. Ao reassistir As Aventuras do Barão de Münchausen, após anos, ele se surpreendeu: “Pensei: esse filme é ótimo. Quem fez isso? Eu queria ser esse cara de novo”.
De fora dos EUA e de Hollywood
Terry Gilliam, que renunciou à cidadania americana, não esconde seu distanciamento: “Não vivo mais nos Estados Unidos e nem pretendo. Trump e companhia transformaram tudo num espetáculo grotesco. Talvez ele consiga unir o país de uma forma que ninguém conseguiu… como Nixon com a China”.
Mesmo diante das dificuldades, o diretor segue em busca de recursos e mantém viva sua vontade de contar histórias provocativas, fora dos moldes conservadores da indústria atual.
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